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Pornografia, patriarcado e capitalismo: o que está por trás de uma das industrias mais rentáveis do mundo

Recentemente foi noticiado que um menino de 12 anos estuprou a irmã de 9 após ter acesso à um vídeo pornô sobre incesto na internet. Em um primeiro momento questionamos “onde estavam os pais dessa criança?”, mas tiramos o foco do assunto principal: por que esse tipo de conteúdo é disponibilizado na internet?

Capitalismo e pornografia

Atualmente, existem no ar cerca de 4,2 milhões de sites com conteúdo pornográfico, o que representa cerca de 12% do conteúdo da rede. 25% das buscas diárias são sobre pornografia e 34% dos usuários de internet foram expostos a pornografia indesejada. Por mês, são feitos cerca de 1,5 bilhões de downloads de conteúdo pornográfico, o que representa 35% de todo conteúdo baixado na internet. 42,7% dos usuários de internet consomem pornografia e 72 milhões de usuários visitam sites pornográficos por mês.

A cada ano são lançados cerca de 13,000 novos vídeos pornôs e a cada 39 minutos um novo vídeo pornô é produzido nos Estados Unidos.

A cada segundo cerca de US $ 3.075,64 são gastos em pornografia, 28.258 estão consumido conteúdo pornográfico e 372 pessoas estão digitando termos adultos em sites de busca.

É difícil ser exato, mas estima-se que a indústria pornográfica movimenta aproximadamente 97 bilhões de dólares por ano pelo mundo todo. 28% da receita mundial de pornografia vem da China (cerca de $27,40 bilhões), o que é equivalente ao suficiente pra alimentar 62% da população mundial que passa fome durante um ano.

Em 2006, foi feito um estudo que mostrou que por ano, a indústria americana gasta algo em torno de $13,33 bilhões em pornografia.

10 tecnologias que consideramos indispensáveis foram criadas pela indústria pornográfica. No livro “The Erotic Engine”, o jornalista Patchen Brass aborda como a pornografia exerce sua influência sobre os avanços da comunicação em massa, onde encontramos 10 tecnologias que consideramos indispensáveis mas que devem sua existência a industria pornográfica:

1- E-commerce: Na década de 1990, a estrela de pin-up , Danni Ashe, lançou um site comercial, cobrando apostas por pornografia softcore. Na sua primeira semana, o Hard Drive de Danni obteve um milhão de acessos. Nos próximos dois anos, foi o site mais movimentado na web. Em 2001, Ashe empregou quarenta e cinco pessoas e obteve US $ 8 milhões em lucro anual. Ela e outros pornógrafos foram pioneiros nas soluções de comércio eletrônico e segurança que abriram caminho para o PayPal, eBay, Amazon e a comercialização da Internet.

2- Streaming de video : em 1994, a empresa de pornografia holandesa Red Light District desenvolveu o primeiro sistema de transmissão de vídeo baseado em internet. Eles abriram o caminho seguidos por CNN.com (1995), YouTube (2005), Hulu (2008) e muitos outros. Sem transmissão de pornografia, os webcasts de hoje – desde endereços presidenciais até vídeos de gatinhos virais – ainda seriam coisas de ficção científica.

3- Webcams: muito antes de se tornarem grampos da sala de reuniões, webcams e video-bate-papo foram usados ​​principalmente para shows de sexo ao vivo. “Em 1995, eu poderia encontrar comunidades de webcam com pessoas que tiraram suas roupas se eu fizesse”, disse em entrevista um dos pioneiros a adquirir o acessório “Mas até aproximadamente 2007, não havia um amigo meu que eu poderia ter uma conversa de vídeo não-sexual ” Isso são 12 anos de desenvolvimento tecnológico impulsionado por pornografia antes que se tornasse de conhecimento popular.

4- Banda Larga: a demanda por conteúdo sexual levou o mercado a roteadores, switches, relés e outras infra-estruturas fundamentais da Internet. Os primeiros usuários buscaram conexões mais rápidas, mais fáceis e mais confiáveis ​​através das quais trocassem texto, fotografias e vídeos pornográficos que aumentassem a largura de banda.

5- Bulletin Board System- essas comunidades locais e on-line foram dominadas por pessoas comprando, vendendo, negociando, roubando e criando pornografia. Em 1992, havia 45 mil desses serviços nos Estados Unidos, com mais de 12 milhões de usuários. Os assinantes pagaram US $ 100 milhões em taxas de assinatura, instalaram quase 5 milhões de novas linhas telefônicas e geraram mais de US $ 850 milhões para empresas de telefonia. É chocante quanto dinheiro as pessoas gastam em tecnologia nova e melhorada para acessar conteúdo sexual.

6- Legendas e closed-caption para pessoas surdas: Quando a Internet abriu mercados globais, os produtores descobriram duas coisas: os consumidores de pornografia realmente estavam interessados ​​em dialogar, e eles tinham um interesse maior do que a média em garantir que as legendas não bloqueassem o visual. Sempre interessado na solução mais barata, as empresas de pornografia investiram em um novo software que automatizava a colocação de legendas para invasividade mínima. Este mesmo software que agora torna mais eficiente e rentável para as empresas mainstream legendar e subtitular seus produtos.

7- Microficha: As bibliotecas do sistema ainda utilizam para arquivar periódicos podem ser atribuídos a “microfotografia Stanhope” no final do século XIX. Durante décadas, este meio especializado foi usado principalmente para esconder fotos picantes em fobs e em canetas. Foi apenas na década de 1920 que um banqueiro de Nova York chamado George McCarthy descobriu que a mesma tecnologia poderia ser usada para a manutenção de registros.

8- Camera digital: Os analistas concordam que os fotógrafos pornográficos apreciaram não ter que levar o filme fotomat para processamento. As preocupações com a privacidade os levaram a se tornar adotadores precoce da fotografia digital.

9- VHS: O VHS é uma ideia que saiu do papel através de fortes investimentos dos pornógrafos. A maioria das pessoas estava perfeitamente feliz de sair para um filme e não via necessidade de um novo e caro dispositivo de visualização em casa. Porém, os consumidores de pornografia gostavam de ver sozinhos. Eles foram alguns dos primeiros a comprar videocassetes, mantendo a tecnologia viável o tempo suficiente para que ele se tornasse popular.

10- Tv a cabo: Este grampo da mídia moderna recebeu um impulso inicial de uma fonte desprezível. Em 1976, o Canal de acesso publico de Manhattan tinha cerca de 80 mil assinantes. Então, George Urban lançou “The Ugly George Hour of Truth, Sex and Violence”, no qual ele rondava as ruas de Manhattan, intimidando mulheres para que entrassem em um beco e tirassem a roupa para a câmera. Treze episódios mais tarde, as assinaturas eram mais de 100.000, e no final de sua segunda temporada, eles eram até 300.000.

Com isso não queremos defender que a pornografia foi um agente “benéfico” para tecnologia mas levantar a ideia já defendida a anos por Gail Dines: Pornografia não é um amontoado de imagens aleatórias, não é fantasia – fantasia acontece na cabeça, pornografia acontece nos bancos internacionais do capitalismo. Dois lugares completamente diferentes.

A explosão do pornô heterossexual em 1990 gerou lucros absurdos, tornando-o a menina dos olhos do capitalismo. A industria tem receitas que ultrapassam Microsoft, Google, Amazon, eBay, Yahoo, Apple e Netflix juntos.

A ‘corporatização’ da pornografia não é algo que acontece ou que vai acontecer, é algo que já aconteceu – e se você ainda não se ligou nesse fato, não há mais lugar nessa mesa pra você. É Las Vegas acontecendo de novo: os independentes, mafiosos renegados e empreendedores visionários sendo varridos pelas grandes corporações”. – Adult Video News, 2009

Um estudo feito em 2006, a receita mundial da industria havia pulado pra US $ 97,06 bilhões.

13.000 vídeos para adultos são produzidos em 2007 no USA, acumulando mais de US $ 13 bilhões em lucro. Em comparação, Hollywood lançou 507 filmes e fez apenas 8,8 bilhões.

Devido à extrema rentabilidade da pornografia, seus produtores se esforçam para capturar uma maior participação de mercado. Eles produzem pornografia mais violenta com  mulheres cada vez mais novas e atos mais degradantes e assuntivos. O capitalismo valoriza o lucro acima de tudo, desvinculando assim a consideração pela igualdade de direitos, moral ou canos às relações pessoais. ¹

A pornografia exige uma mão de obra barata e uma força de trabalho descartável, para que haja o máximo de lucro: Não gosta dessa garota? Como consumidor você pode passar para o próximo vídeo. Ela contraiu DST durante a produção de um filme? Como produtor você a demite e contrata uma nova sem doenças.

A desigualdade econômica é a força capitalista que a indústria adulta explora já que muita das vezes é a motivação para comercialização do sexo.

A pornografia comanda a internet, os magnatas do pornô investiram alto pro seu desenvolvimento, ela está em tudo. Você já assistiu o filme ‘A Garota Ideal’ ? Pra esse filme ser feito foram consultados os donos da empresa RealDolls, que fabricam mulheres de silicone“anatomicamente corretas” ( a lista de espera pra comprar essas bonecas é de 6 meses), no dia do lançamento do filme, os servidores do site caíram pelo grande número de acesso.

35.5% dos homens que consomem pornografia tem uma renda anual acima de 75 mil dólares, Gail Danes diz, em uma de suas muitas palestras sobre o tema, que cada vez que um homem compra pornografia, isso vai para um cartão de crédito. Imaginem o quanto dinheiro as empresas de cartão de crédito ganham com isso. Pensem nas conexões entre a mídia popular e a pornografia. E que quando lidamos com a Indústria Pornográfica, estamos lidando com um poder cultural, social e político que tem o poder de definir o panorama sexual, pois trabalham como qualquer outra indústria.

Se dizemos que a industria da moda nos educa em como devemos nos vestir, a industria pornográfica nos educa sobre o comportamento sexual humano, mas o quando isso é prejudicial?

Pornografia e patriarcado

Em 2016 o PornHub, um dos inúmeros hospedeiros de conteúdo pornográfico, recebeu 23 bilhões de visitas. A palavra mais procurada mundialmente foi “lésbica”, seguido de “madrasta” e “MILF” (mulheres que são mães) e as mais buscadas mundialmente foram: “Lésbica”, “Adolescente”,Ebony (mulheres negras), “MILF” e “Anal”.

Apenas 9,9% das cenas mais vendidas possuem algum tipo de comportamento como beijo, riso, acariciamento ou elogio; tapas ocorrem em cerca de 41.1% das cenas; 88,2% das cenas pornográficas mais votadas contêm atos agressivos.
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Em 70% das ocorrências, um homem é a autor da agressão; 94% do tempo o ato é direcionado para uma mulher.
As cenas pornográficas têm temas sexistas e racistas. Os sites geralmente contêm menus em que os usuários podem selecionar gêneros das etnias das mulheres, tipos de corpo, e idades. Existem também escolhas como “amador”, “interracial” e a categoria “adolescente” sempre popular. Homens e mulheres que são outras coisas além de brancos são representados de maneira estereotipada e degradante. O sexo apresentado em filmes pornográficos normalmente está focado no prazer sexual masculino e em seu orgasmo, ao invés de estar igualmente com o das mulheres.

Estudos mostram que, depois de ver pornografia, os homens são mais propensos a: diminuir a empatia com as vítimas de estupro; têm tendências comportamentais cada vez mais agressivas; relatam acreditar que uma mulher que se veste provocativamente merece ser estuprada ; criam raiva de mulheres que flertam mas se recusam a ter relações sexuaisrelatam menor interesse sexual em suas namoradas ou esposas e relatam maior interesse em coagir parceiras em atos sexuais indesejados(Yang, Gahyun, 2012) Em sumo, a industria pornográfica é responsável por vender a cultura de compra e venda de mulheres, de objetificação do corpo feminino, ou como diria o Dr. Fouber, ” a pornografia é a receita do estupro”. 


Em 2003, a lei que proibia pornografia com mulheres que aparentavam ser menores de idade foi derrubada. De repente, houve  então uma explosão de vídeos do gênero,estão na sessão “teen” dos sites pornográficos, como:
 Primeira vez com o papai” ,”Puta do papai” ,”Tudo bem ela é minha enteada”, “Provocando o padastro”. Há uns meses atrás, numa busca rápida no google, ao digitar o termo “pai e filha”, esse era o tipo de conteúdo encontrado:

Digitar 'pai e filha' no Google é entender porque precisamos do feminismo

Digitar 'pai e filha' no Google é entender porque precisamos do feminismo

 

Devemos então lembrar que 95% dos casos de abusos sexuais infantis são cometidos por homens e que 87% das vítimas são meninas e que, diariamente, são feitos cerca de 116,000 pedidos de material pornográfico infantil, cerca de 100,000 sites oferecem esse tipo de conteúdo e que 20% de todo o conteúdo adulto disponível é infantil . A pornografia contribui pra pedofilia.

A maioria dos sites não faz a menor questão de esconder o seu discurso de ódio e nojo às mulheres, como é o caso do Gag me and fuck me, que apresenta na sua página o seguinte texto: “Sabe o que a gente diz sobre romance e preliminares? A gente diz FODA-SE! Esse site não é para meias-bombas tentando impressionar vadias metidas. A gente pega lindas putas e faz o que todo homem REALMENTE gostaria de fazer. A gente faz elas engasgarem até a maquiagem borrar e deixamos todos os outros buracos ardendo – vaginal, anal, dupla penetração e qualquer ato envolvendo um pinto e um orifício. E depois damos um banho grudento nelas.” ou então o Pure Filth que diz : “Aqui na Pure Filth nós sabemos exatamente o que vocês querem e damos isso para vocês. Gatas sendo fodidas no rabo até seus esfíncteres ficarem rosa, inchados e totalmente explodidos. Fraldas geriátricas vão esperar essas putas quando o trabalho delas acabar”.
Dados afirmam que a idade média do primeiro contato online com conteúdo pornográfico é aos 11 anos, agora, imaginem um garoto de 11  anos no auge de seus hormônios se deparando com um texto desse? Correlacione isso a toda nossa estrutura social que cobra desde o nascimento que nossos meninos sejam homens de verdade, é a receita perfeita para os números crescentes de misoginia, estupro e feminicídios.
A expectativa de vida de uma atriz pornô é de 36,2 anos, passando em apenas um ano a expectativa de vida de um escravo nos EUA em 1850, a maior parte dessas mortes são causadas por DSTs ou depressão recorrente de abusos sexuais. 70% dos casos de DST ocorridos na industria pornográfica afetam mulheres. A pornografia é resultado direto do patriarcado social em um contexto capitalista.
A pornografia utiliza do mesmo mecanismo do tráfico de mulheres: ela te convence que as mulheres ali “são diferentes das que você conhece”, então quando ela produz filmes que contém cenas que claramente demonstram estupro e violência sexual, você não enxerga seres humanos, você enxerga “putas” “vadias” “objetos sexuais” “depósitos”. A pornografia  é a transformação do sexo em uma mercadoria comercial para o consumo popular que promove misoginia e mata mulheres.

 

 

 

 

 

Fontes: http://www.toptenreviews.com/internet-pornography-statistics/

Pornhub’s 2016 Year in Review


http://colunas.revistaepoca.globo.com/mulher7por7/2010/07/08/pornografia-aumenta-violencia-sexual-contra-mulheres-e-criancas-diz-sociologa-americana/
https://www.vice.com/pt_br/article/pge3jm/rosebud-porno-prolapso-anal
http://www.ministryoftruth.me.uk/wp-content/uploads/2014/03/Facts-and-Figures-Stop-Porn-Culture.pdf
https://www.nexojornal.com.br/expresso/2017/06/19/O-que-os-dados-de-uma-d%C3%A9cada-dizem-sobre-o-consumo-de-porn%C3%B4-na-internet
http://dro.deakin.edu.au/eserv/DU:30010424/pease-factorsinfluencingcommunity-2006.pdf
http://www.dailymail.co.uk/news/article-4755176/The-women-girls-killed-men-addicted-pornography.html http://www.telegraph.co.uk/women/life/violent-porn-dangers-posed-to-women/amp/
http://www.dianarussell.com/porn_as_a_cause_of_rape.html
¹ http://www.truth-out.org/opinion/item/5791:capitalism-and-loneliness-why-pornography-is-a-multibilliondollar-industry
https://www.theguardian.com/tv-and-radio/2017/sep/10/david-simon-george-pelecanos-the-deuce-pornography-drama-interview-the-wire
http://www.businessinsider.com/the-producer-of-middle-men-talks-to-us-about-how-pornographers-invented-e-commerce-2010-8
http://www.enterprisefeatures.com/ten-indispensable-technologies-built-by-the-pornography-industry/
http://unwantedurl.com/
http://www.festivalmarginal.com.br/sexo/como-a-pornografia-cria-o-cliente/

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Written by Larissa Naedard

Anarcofeminismo, especifismo e axé.