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Durkheim e o fato social

As regras do método sociológico é um livro escrito por Durkheim com o objetivo de estabelecer o lugar da sociologia como a ciência que estuda as sociedades partindo da análise de grupos, não se pautando no indivíduo. Já no início da introdução o sociólogo levanta um ponto importante para a análise que seguiria, afirmando que até então os sociólogos não tinham se preocupado o suficiente com a caracterização do método usado, esse problema é a premissa que Durkheim usa para estabelecer seu método. “Fomos, portanto, pela força das próprias circunstâncias, levados a elaborar um método mais definido, ao que julgamos, e mais exatamente adaptado à natureza particular dos fenômenos sociais” (DURKHEIM, 1895 P. 387)

O caráter cientifico que Durkheim pretende dar a sociologia fica claro quando no primeiro capítulo, em que ele busca mostrar e delimitar o objeto da sociologia, antes mesmo de demonstrar o método sociológico. Durkheim chama de fato social o objeto da sociologia, inicia o primeiro capítulo com o que chama de Formula geral do fato social, explicitando o caráter cientifico que pretende com a sociologia.

O fato social não pode definir-se pela sua generalidade no interior da sociedade. Características distintivas do fato social: 1.º – a sua exterioridade em relação às consciências individuais; 2.º – a ação coerciva que exerce ou é suscetível de exercer sobre essas mesmas consciências. Aplicação desta definição às práticas constituídas e às correntes sociais. Verificação desta definição. Outra maneira de caracterizar o fato social: o estado de independência em que se encontra em relação ás suas manifestações individuais. Aplicação desta característica às correntes sociais. O fato social generaliza-se por ser social, mas não é social porque se generaliza. Como esta segunda definição se reduz à primeira. Como os fatos de morfologia social se enquadram nesta mesma definição. Formula geral do fato social. (DURKHEIM,1895 p. 389)

O autor busca mostrar com a formula duas características principais na definição do fato social. Todo fato social é externo aos indivíduos e tem caráter coercitivo em relação aos mesmos. Externo por ter influência sobre grupamentos de pessoas, várias consciências individuais, e coercitivo pois se estabelece como padrão, regra, obrigação ou costume, os fatos sociais são punitivos aos que escapam ao padrão.

O fato social é geral ao grupo e por isso externo ao indivíduo, é algo que se impõe ao grupo que está sujeito. O fato social é comum entre os membros da sociedade e se manifesta ao grupo. Já a coerção seria uma garantia da manutenção do fato dentro do grupo e pode se dar de diversas maneiras, desde formas mais brandas como segregação e risadas dentro do grupo até a violência física pelo estado que visa a manutenção do respeito pela norma.

Na visão de Durkheim, a forma como são dadas relações de trabalho, leis e até no âmbito familiar podem ser encaradas como fato social a medida em que são dadas por relações padronizadas que estão sujeitas a coerção para se manterem similares e dentro da concepção que o meio social tem dessas relações. Como mostra DURKHEIM, (1895 P. 389) “Quando desempenho a minha obrigação de irmão, esposo ou cidadão, quando satisfaço os compromissos que contraí, cumpro deveres que estão definidos, para além de mim e dos meus atos, no direito e nos costumes”.

O objetivo da definição do fato social como foi feita é a delimitação de um objeto de estudo para a sociologia e assim dar a ela um caráter cientifico, diferenciando-se da filosofia, estabelecendo a sociologia como uma nova ciência. A sociologia conforme estabelecida por Durkheim é o campo de estudo das sociedades partindo da análise dos grupos e das ações tomadas coletivamente.

O objetivo do primeiro capítulo não só a delimitação do objeto de estudo, mas também o que torna a sociologia diferente das outras ciências, na metodologia, na forma de análise. Como foi mostrada a diferença das demais ciências e um objeto foi delimitado, é evidente a necessidade do surgimento de uma nova ciência.

No primeiro prefácio, Durkheim fala um pouco da conduta que o sociólogo deve ter em relação as descobertas feitas, ressalta que não estamos habituados a tratar cientificamente fatos sociais e por isso sociólogo deve acautelar-se com primeiras impressões. As descobertas do sociólogo podem desconcertar e mudar a concepção que se tinha antes e, portanto, ele deve ir até o fim em suas análises. Além disso ele coloca o método como essencialmente conservador, afirmando que os fatos sociais não são maleáveis à vontade humana.

Outro ponto importante no prefácio da primeira edição é a vinculação que o autor faz da sua análise com o racionalismo, escola filosófica relacionada ao surgimento do método cientifico. DURKHEIM (1895 P. 376) escreve “Aquilo a que se chamou nosso positivismo é apenas uma consequência deste racionalismo”

Já no prefácio da segunda edição Durkheim se pauta em esclarecer críticas e controvérsias suscitadas pelo livro, um espaço destinado a fundamentar o que não ficou claro com o livro e também de reafirmar o que foi dito em oposição as críticas. Assim ele demonstrou equívocos em relação a percepção que tinham de seu método e ponto de vista.

Um exemplo de crítica respondida no prefácio da segunda edição é o fato de terem eliminado o elemento mental da sociologia, quando foi explicitado que por mais que existam as consciências individuais a sociologia estuda os grupos e os fatos referentes a eles, não importando o indivíduo na análise.

A questão da consciência individual é um ponto de nítida diferenciação entre a sociologia e a psicologia. Onde a sociologia não vê objeto, o indivíduo, é onde se concentra o foco da psicologia. Assim vai se dando a diferença entre as ciências.

No prefácio da segunda edição, DURKHEIM (1895 P. 376) esclarece uma crítica feita a premissa de seu método, tratar fatos sociais como coisas “É coisa todo objeto de conhecimento que não é naturalmente compenetrado pela inteligência, […] tudo o que o espírito só consegue compreender na condição de se extroverter por meio de observações e de experimentações […] Não podem ser descobertas pela introspecção, por mais atenta que seja”

A crítica acerca do tratamento dos fatos sociais como coisas é algo que merecia esclarecimento por parte do autor, afinal é uma das premissas principais no fundamento da ciência em questão, por isso ele destinou a primeira parte deste prefácio a esse esclarecimento.

Ainda na primeira parte deste prefácio o autor também estabelece similaridades da sociologia em relação a outros campos da ciência, bem como a forma como os cientistas devem encarar a análise de seus objetos de estudo. Como demonstrado por DURKHEIM (1895 P. 379) “Ela reclama do sociólogo é que este adote o estado de espírito em que se colocam os físicos, químicos ou fisiologistas, quando se embrenham numa região ainda inexplorada do seu domínio científico”

Já na segunda parte do prefácio a segunda edição do livro o autor se pauta na crítica de outra de suas premissas fundamentais que é a concepção de fenômenos sociais como exteriores ao indivíduo, DURKHEIM (1895 P. 379) afirma: “Qualquer sociedade dá origem a fenômenos novos, diferente dos que ocorrem nas consciências solitárias, é necessário admitir que esses fatos específicos residem na sociedade que os produz e não nas suas partes”

Como já demonstrado, o caráter externo do fato social é das características que o definem, está presente na formula geral do fato social. O caráter externo é, portanto, algo devidamente esclarecido pelo autor pois essa premissa é algo que fundamenta o fato social, seu objeto, e fundamenta também toda a ciência que surge.

O pensamento coletivo global deve ser estudado, tanto na forma como no conteúdo, por si e em si mesmo” (DURKHEIM,1895 p. 382)

Durkheim evidencia duas formas de consciência, o estado de consciência coletiva e individual, quando busca estabelecer no prefacio a questão do caráter externo do fato social, e coloca o pensamento coletivo como parte do objeto sociológico, parte do fato social.

Na terceira e última parte do segundo prefácio, Durkheim faz suas considerações finais a respeito das críticas feitas ao livro, afirmando que algumas eram contraditórias entre si, como os que acharam a definição do objeto estreita enquanto outros a achavam muito abrangente. DURKHEIM (1895 p. 389) também define o conceito de instituição nesta parte do prefácio “Chamar de instituição a todas as crenças e a todos os modos de conduta instituídos pela coletividade; a sociologia pode então ser definida como a ciências das instituições”

Ao ler as regras do método sociológico de Durkheim fica claro que a sociologia busca, desde que estabelecida, a compreensão dos grupos e instituições das sociedades humanas partindo de uma análise que não se pauta no indivíduo e sim na coletividade, seus fenômenos e manifestações.

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Written by BarretoLeiteJ

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