É hora de começar a compreender a resistência indígena que tem mobilizado a Argentina.
“Nós quando levantamos a ideia de libertação nacional Mapuche e de reconstruir nosso mundo, não estamos propondo a construção de um estado Mapuche.
Nós nunca proporíamos isso, simplesmente porque o Estado é um conceito ocidental. Nós existimos antes do estado.
Queremos viver como Mapuche, dentro de nossas terras.”
(Jones Huala)

É importante salientar que a companhia de Luciano Benetton não é a única “dona da Patagônia”, magnatas americanos como Douglas Tompkins e Ted Turner (fundador da rede de notícias CNN), além Ward Lay, diretor Pepsi-Cola, entre outos, também têm enormes extensões de terras na Patagônia.
Estes estrangeiros são acusados não apenas pelos Mapuche, mas pelo resto da população local de limitar o acesso pelos argentinos para algumas das maiores belezas naturais de seu país, como os lagos e montanhas da região da Cordilheira dos Andes.
Os Mapuche e a Benetton na Era Macri
Apesar de tantos anos passados desde 1991, os conflitos entre os Mapuche e a Benetton estão apenas começando e alcançaram recentemente contornos dramáticos. Desde a primeira expulsão dos Mapuche, a Benetton tem inserido pessoas armadas no local e atualmente tem militarizado a região com o apoio do governo de Mauricio Macri.
Em 2015 um território foi recuperado por um pequeno grupo organizado de Mapuches em Chubut (província da Patagônia), este grupo criou nesta região algumas aldeias.
Um nome de destaque na liderança dos movimentos de recuperação de terra dos Mapuche é El Lonco (como chamam os chefes mapuche) Facundo Jones Huala, que no dia 27 de Junho deste ano foi preso na Unidade Penitenciária 14 de Esquel na Argentina, ele é acusado no Chile de provocar um incêndio em um latifúndio no ano de 2013. O estado Chileno pede sua extradição por considera-lo um terrorista. Ele nega que seja um terrorista e diz que não se vale de armas de fogo para se defender, apenas de pedras e padaços de pau, para ele terrorista é o estado.
Huala lidera aldeias mapuche chamadas por lá de Pu Lof en resistencia de Cushamen (pluralidade de comunidades mapuche) e de dentro da prisão tem sido uma voz que tem ecoado pelos jornais ao se pronunciar contra as marcas que combate e contra o capitalismo desmedido. “Apresentamos um diálogo qualificado tanto na Argentina como no Chile, mas não se dignaram a dialogar porque defendem os interesses das grandes empresas e nós mapuches somos um entrave para ele. Com o kirchnerismo fomos reprimidos e vigiados, mas com o macrismo isso se multiplicou por três. Minha prisão é ilegal, considero que estou sequestrado pelo Estado. Por isso pedimos a solidariedade internacional e assim como muitos vão às ruas condenar o regime de Maduro, aqui, os Povos Originários precisam que o mesmo seja feito com a repressão brutal que existe contra as organizações sociais e o povo mapuche” (disse recentemente em entrevista para o jornal El País).

Em 10 de janeiro de 2017 cerca de 200 policiais da gendarmeria (espécie de tropa de choque federal da Argentina) armaram uma ação violenta para expulsar os indígenas de Chubut.
De acordo com relatório da Anistia Internacional neste dia as forças de segurança cometeram “atos de violência e repressão […] incluindo pancadas, uso de cassetetes, mulheres com o cabelo puxado e assédio de crianças dentro da comunidade”. Mais tarde naquele mesmo dia, a polícia local invadiu novamente a comunidade nativa sob a justificativa de uma denuncia de roubo de animais. No dia seguinte, a mesma polícia realizou um segundo ataque contra outra comunidade Mapuche nas proximidades, disparando balas de chumbo e borracha, o que resultou em quatorze feridos, incluindo um membro da comunidade que machucou a mandíbula.
No dia primeiro de agosto de 2017, a policia local e a gendarmeria executaram uma nova operação, atentando contra a Mapuche. Desta vez, além de atirarem com balas de borracha, os policiais trancaram mulheres e crianças em uma cabana enquanto queimavam seus colchões, cobertores e brinquedos. Denuncias de moradores locais também dão conta de que os policiais teriam bloqueado o acesso ao local, não deixando que ambulâncias e membros de organizações de direitos humanos passassem.
Uma ação que só pode ser realizada graças a uma decisão política para expandir os poderes da polícia, apoiando assim a violência das forças de segurança, que buscam disciplinar os Mapuche por força de balas.

Onde Está Santiago Maldonado?
No mesmo contexto das repressões ocorridas no dia primeiro de agosto de 2017, Santiago Maldonado, de 28 anos, foi levado pela polícia, sendo esta sua última aparição em público, o que teria ocorrido na presença de cerca de mais de 100 agentes da gendarmeria.
Santiago era um anarquista e nômade que, no momento de seu desaparecimento, vivia em El Boson, perto de um território sagrado dos mapuche e que o estado vendeu no passado para a multinacional Benetton. Neste local também havia se construído aldeias de resistência mapuche. Solidarizando-se com a causa Santiago ajudava os Mapuche no que podia, com alimento, água, além de estar presente, resistindo em outras repressões da policia.
No dia primeiro de Agosto de 2017 chegou até a comunidade a informação de que ocorreria uma operação de desocupação dos territórios. A comunidade decidiu então que não deixaria passar ninguém e bloqueou a estrada que dava acesso ao local com pinheiros, passando a informar aos motoristas do que estava acontecendo. Ao constatar que as várias caminhonetes da policia que se aproximaram não iriam parar neste bloqueio os indígenas fugiram atravessando um rio. Mas Santiago Maldonado não sabia nadar. Segundo testemunhas, os oficiais da gendarmeria o pegaram escondido entre arbustos e após uma surra o levaram em uma caminhonete branca.
Desde então Santiago Maldonado é dado como desaparecido, se tornando um simbolo da luta Mapuche e o primeiro desaparecido politico da Era Macri.
“É dramático que na democracia mais longa de nossa história tenhamos que anunciar o desaparecimento forçado de alguém”, disse em coletiva a presidente das Avós da Praça de Maio (grupo que busca localizar as crianças sequestradas ou desaparecidas pela ditadura militar argentina (1975-1983) e a punição dos responsáveis), Estela de Carlotto.
“Santiago foi perseguido pelas forças da Polícia e, portanto, não podem dizer que não tiveram nada a ver”, afirmou o prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel à Radio 10.
O Ministério da Segurança ofereceu uma recompensa de 500.000 pesos “a quem fornecer dados para encontrar” Maldonado, mas disse ter recebido um relatório da Gendarmeria que assegura “não ter detido o jovem”.
Os mapuche, familiares e amigos de Santiago Maldonado responsabilizam pelo seu desaparecimento forçado
O ESTADO ARGENTINO (presidente Mauricio Macri)
A GENDARMERIA
PATRÍCIA BULLRICH ministra de segurança
PABLO NOCETTI segundo de segurança
LUCIANO BENETTON
ALBERTO WERETILNEK governador de Rio Negro
MARIO DAS NEVES governador de Chubut

ARTE DA VITRINE: Matheus Mattos
Agradecimentos: as amigas Silvana e Priscilla Oliveira.
EDIT: Santiago Maldonado foi encontrado morto no rio Chubut em 17 de Outubro de 2017.