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O fetichismo de mercado “verde”: uma resposta ao texto “O ativismo é de mercado, também” e a necessidade de uma militância antiespecista de horizonte estrutural – Ana Mota, Kauan Willian & Luana Queiroz

Introdução 

Muitos veganos antiespecistas (pessoas que lutam pelo fim de todas as dominações, incluindo de espécies) estão se perguntando o motivo que fazem pessoas, cada vez mais, quererem e defenderem maioneses e outros produtos supérfluos sem nenhum valor nutricional de marcas envolvidas com trabalhos análogos à escravidão e com departamentos próprios com testes e aprisionamento de animais, que possuem rótulos de “veganos.” Além do valor caríssimo e, mesmo com inúmeras receitas caseiras e produtos de marcas com menos impactos ambientais e não envolvidas em testes e torturas, ou mesmo orgânicas, os ativistas e militantes veganos são abordados por outros ativistas, pessoas de ONGs, empresários (vestidos como ativistas), youtubers e outros que defendem o consumo e o apoio a determinados produtos – o que eles chamam de “veganismo estratégico”. Esta corrente acredita que apoiando e divulgando produtos “veganos” de multinacionais vão fazer empresas mudarem, e, aí sim, o consumo de pessoas e seus estilos de vida. Já, em contraposição, o “veganismo abolicionista” visa boicotar empresas, inclusive relacionadas a testes, trabalho análogo à escravidão, que patrocinem rodeios, etc. Para nós, também, o conceito de especismo – a dominação de animais por animais humanos – não faz sentido se não libertamos também nós mesmos, preconceitos de raça, sexualidade, gênero, classe, etc.

 Esse texto é uma crítica a esse chamado “veganismo estratégico” a partir de uma leitura do texto “O ativismo é de mercado, também” do blog veganismoestrategico.com.br lançado no dia 13 de setembro de 2018 assinado por Guilherme Carvalho. A escolha pelo texto não é algo pessoal, mas acreditamos que, ao rebater seus argumentos – que defendem um “ativismo de mercado”, a disputa de grandes nacionais e “fim intolerância ideológica intramovimento” – comuns na fala de várias dessas pessoas, podemos tensionar outra visão de veganismo, além de rebatermos o motivo que fazem essa corrente “estratégica” do veganismo ser paradoxal com uma transformação estrutural da sociedade e que finde a dominação de todos os animais por animais humanos. Por fim, defendemos ainda não só o boicote, mas a verdadeira estratégia, a necessidade de uma militância vegana antiespecista, ao invés apenas de ativismos como somente estilos de vida, mas que almejem uma transformação definitiva da sociedade.

“Hellmann’s”, da Unilever, famosa por testar em animais, com selo vegano da SVB

Por um veganismo que entenda seu lugar histórico e sociológico – rebatendo a “Parte 1: Os pacotes de crenças”

Para defender o uso de produtos de marcas envolvidas com testes em animais em massa e com mais-valia extrema de pessoas, que possuem o rótulo vegano em suas embalagens, o autor do texto joga um espantalho argumentativo, principalmente na sua introdução. Que alguns veganos “de esquerda” tendem a ter “intolerância” com ativistas que confiam e almejam disputar o mercado – no nosso ver o capitalismo. Jogando esse espantalho, ele argumenta, mesmo nas entrelinhas, que alguns veganos que boicotam empresas que testam em animais tem um “viés ideológico” que impede outras pessoas de serem veganas e assim interrompe outros tipos de ativismos ou visões de transformação. Ele diz “isso é uma crítica a quem é vegano de esquerda? É claro que não. Você pode ser vegano de esquerda ou vegano de direita; vegano ateu ou vegano evangélico – contanto que tenha respeito e a tolerância aos diferentes modos de pensar dentro do veganismo.”

Essa visão vem de uma incompreensão do veganismo – ou uma compreensão limitada do veganismo, outro espantalho no texto de Carvalho – que considera o veganismo limitado a verbetes enciclopédicos ou resumos de idéias que seria: “O veganismo é uma forma de viver que busca excluir, na medida do possível e do praticável, todas as formas de exploração e de crueldade contra animais, seja para a alimentação, para o vestuário ou para qualquer outra finalidade.” Embora seja verdade, esse resumo limita uma compreensão pessoal do “praticável” além de deixar o movimento como algo individual. Seria o mesmo dizer que os “liberais defendem o capitalismo”, “os anarquistas querem destruir o Estado e o capital”, e “os comunistas querem uma sociedade igualitária com um Estado regulador no meio dessa transição” – todas as afirmações verdadeiras, mas limitadas e não aprofundadas. Por isso defendemos que todo vegano que quer se transformar em ativista ou militante compreenda a história desse movimento e seus preceitos sociológicos – assim como você entra em qualquer movimento. Historicamente, querendo ou não, o movimento de libertação animal tenta excluir tudo que esteja relacionado com dominação e relação com animais, no mínimo, e foi uma síntese de críticas à industrialização, depois ao neoliberalismo, ao patriarcado e ultimamente ao racismo. Existe uma ampla bibliografia que trata desse assunto, onde ressaltamos “A anarquia e os animais” de Eliseé Reclus, biografias sobre Charllote Despard, “A política sexual da Carne” de Carol Adams, “Animal Rights: The Abolitionist Approach” de Anna Charlton e Gary Francione, e entrevistas sobre a relação do racismo, capitalismo e consumo de animais de Angela Davis e vídeos no youtube da intelectual Sabrina Fernandes sobre veganismo e ecossocialismo.

Capa do livro já clássico e best seller de Carol Adams que relaciona a construção do especismo com o patriarcado

A política como inevitável – uma resposta à “Parte 2 – Veganismo Apolítico”?

Dizendo isso, podemos rebater o segundo ponto do texto de Carvalho que afirma que alguns veganos ao fazerem uma “imposição do “kit de crenças” afirmam que o veganismo de mercado não é político. Primeiramente não impomos um kit de crenças, mas situando o movimento historicamente, vemos que o veganismo se imbricou e nasceu com debates da social-democracia ambientalista, com o socialismo libertário, com parte do ecossocialismo e no máximo com o liberalismo social ambientalista. Portanto, ele não pode ser anexado, por exemplo, ao nazismo, fascismo, neoliberalismo, stalinismo (já que o ecossocialismo é uma crítica a modelos não ambientais da esquerda). Não se trata de direita ou esquerda, mas de políticas e teorias que enxergam o veganismo como atrelado a uma transformação total da sociedade, que o neoliberalismo norte-americano que faz parte a argumentação de Carvalho, não faz. A visão do autor, o veganismo de mercado, é política sim, como toda ação é política, mas é uma política que não tem como salvar animais e humanos porque incompreende as relações estruturais entre o Estado, sociedade e capitalismo.

Para argumentar, Guilherme Carvalho joga o exemplo de um abolicionista branco “do começo do século 19, o ativista inglês William Wilberforce [que] recorreu a uma inusitada estratégia de mercado (restringir quais nacionalidades de navios poderiam circular em águas britânicas) para conseguir reduzir significativamente a importação de escravos negros na Grã-Bretanha.” E aí vemos a inconsistência do argumento do autor; primeiro Wilberforce não usou uma estratégia neoliberal – de livre concorrência – ele usou o Estado como mediador do fim da escravidão. Segundo ponto que Willberforce, nem nenhum branco, como aponta o pesquisador brasileiro-congôles Kabengele Munanga e a bibliografia abolicionista atual, não foram salvadores de negros e escravizados, eles eram o resultado e acompanhavam um movimento global de resistência de negros que, desde o século XVI minavam a escravidão com fugas, rebeliões, expropriações, quilombos, e principalmente com a Revolução do Haiti – protagonizada por negros – que foi seguida por uma campanha global do fim da escravidão que William Wilberforce acompanhava. Alguns europeus tinham medo de uma tomada do poder pelos negros e almejavam uma transição pacífica – que inclusive perpetuou o racismo como sabemos. Queremos essa transição pacífica ao veganismo, que pode perpetuar o especismo? Não, queremos o veganismo relacionado com uma luta, além do consumo, para que possa chegar ao Estado e suas políticas públicas ou que, quando houver um processo revolucionário, esse leve á cabo o antiespecismo e mude radicalmente essa dominação.

Libertação Animal, Libertação Humana: Todas as opressões estão interligadas – crítica à parte 3Os animais em segundo plano, novamente?”

No texto “O ativismo é de mercado, também”, Guilherme Carvalho diz que precisamos colocar os animais na frente novamente, e nós nos perguntamos: colocar os animais na frente significa comprar produtos de multinacionais que testam em animais, lutar por um veganismo consumista, que não luta ao lado de outros movimentos sociais e só contempla a classe média (classe que tem acesso ao consumo)?

O “veganismo estratégico” da qual propõe Carvalho esconde um viés que acredita em um possível bem-estar dos animais, propondo uma possível redução de danos. Não há como libertar imediatamente animais através apenas do consumo e dentro do sistema capitalista. Como no caso da maionese vegetal Hellmann’s, da Unilever. A Unilever é uma das multinacionais mais poluidoras do mundo, está envolvida com testes em animais e exploração de trabalhadores. Recentemente foi noticiado que, em Goiás, 83 pessoas trabalhavam em situação análoga á escravidão em uma fazenda que produzia tomates com exclusividade para a Unilever, algumas pessoas sofreram ameaças de morte. Esse é o veganismo que queremos?

 Os animais não humanos sempre foram explorados pelos humanos – afinal, o especismo é um sistema de dominação enraizado na sociedade. Porém, eles eram mortos nos fundos dos quintais, pelas famílias e, ás vezes, vendidos em pequenas feiras e mercados populares. Com a terceira revolução industrial e a consolidação do sistema capitalista, o setor frigorífico ganhou forças: animais que antes eram abatidos em menores quantidades, começaram a ser exportados para outros países, foram trancafiados e forçados a se reproduzirem em massa, através de inseminações artificiais e controles reprodutivos, como a castração e até o decepamento de bois, para que a genética se mantivesse “pura”.  O sistema capitalista tem como base a dominação, a prevalência do interesse lucrativo e a transformação de seres sencientes em matéria-prima/máquina; uma reinterpretação do especismo e sua potencialização, logo, é incompatível com qualquer movimento que tenha como objetivo a libertação de qualquer ser oprimido, como os animais. É impossível falar sobre os problemas que os animais enfrentam e ignorar o sofrimento de milhares de trabalhadores dentro dessas indústrias. A preocupação e a luta pela libertação dos animais, sempre esteve na frente, assim como a preocupação e a luta pela libertação humana. Afinal, uma não funciona sem a outra e ambas se completam na luta contra o capitalismo, ou pelo menos seu lado mais predatório contemporâneo, o neoliberalismo, que as multinacionais que Carvalho defende fazem parte.

O logo “Libertação Animal, Libertação Humana” virou o principal mote do veganismo no mundo, portanto libertar humanos não é algo estranho ao veganismo, ao contrário.

“Ativismo vegano de mercado”, nada além de fetichismo da mercadoria e especismo – resposta à Parte 4                                                                          

O ativismo é um estilo de vida, que se torna uma atuação política, proporcionando assim, que não seja necessário abrir mão de prazeres pessoais em nome do fim da exploração animal. Portanto, um ativista de mercado, que não abre mão de prazeres pessoais em nome dos animais, não pode ser considerado vegano. O veganismo – criticando o vegetarianismo de dieta – surgiu do desejo de mudanças verdadeiras, que, para nós, só podem acontecer com a destruição do sistema capitalista e do especismo, com trabalho de base e paciência, ou seja, com estratégia e militância organizada, transcendendo o ativismo pessoal e estilos de vida personalistas.

Na verdade, o ativismo vegano estratégico e o de mercado sofrem algo que grande parte da população global passa desde a ascensão do capitalismo – e isso é perceptível quando o autor diz que devemos disputar os shoppings centers: o fetichismo da mercadoria, e consequentemente aqui, do mercado. Para os autores que teorizam o fetichismo da mercadoria – como Marx – o produto, no capitalismo, perdeu seu valor de trabalho e ganhou um valor subjetivo. É por isso que um tênis Nike pode ser vendido por R$ 2.000, sendo que sua produção foi de R$ 10, por exemplo. O capitalismo precisa de um valor simbólico para lucrar e explorar trabalhadores, fazendo-os trabalhar, ao mesmo tempo que, desejando comprar um produto que não precisam ou que não tem aquele valor de produção. Colocar produtos como salvadores de animais é desconhecer a realidade da população brasileira; só no Brasil, cerca de 13 milhões de pessoas passam fome, ou seja, se as massas não têm dinheiro para comprar o básico, arroz e feijão, como elas terão dinheiro para comprar maionese vegetal de R$10 reais e dois hambúrgueres vegetais por quase R$20 ou R$ 30? É o dinheiro gasto em vários vegetais na feira, no veganismo que nós defendemos, o veganismo popular e que valoriza a nutrição adequada.

O outro lado problemático é que Guilherme Carvalho aponta que o consumo de produtos vegetarianos pode fazer com que pessoas deixem de consumir carne e derivados de origem animal, quando sabemos que, sem informação sobre a exploração animal, os produtos de origem vegetal, podem se tornar apenas mais um item na lista de compras da classe média. Sim, da classe média, pois esses produtos não chegam nos bairros mais pobres e uma pessoa que sobrevive com um salário mínimo, por exemplo, não vai deixar de consumir uma maionese de origem animal que custa R$3. A classe média vegana, na verdade, tem fetiche de ter uma maionese cara em sua geladeira, como seu vizinho tem, ao invés de fazer feira – como sua “empregada” faz.  

A estratégia paradoxal e a utopia de somar com os inimigos – resposta à “Parte 5: Está funcionando?”e “Parte 6: Tem outra abordagem? Some, em vez de dividir.”

Não é nenhuma novidade que a porcentagem de pessoas que estão aderindo ao veganismo e a uma alimentação vegetariana sem nada de origem animal, está crescendo nos últimos meses e anos, tanto no Brasil, quanto no resto do mundo. Não obstante, o autor criticado aqui sempre compara aos dados dos EUA, um país com diferença brutal da economia e que tem um veganismo de mercado, devido ao seu consumismo e liberalismo estrutural, muito diferente de um país de capitalismo periférico. Ou seja, seu tencionamento por um ativismo de mercado e por ONGs com perfomances liberais parecidas com os EUA não cabem aqui por razões econômicas óbvias.

Dito isso, é necessário pontuar que não há indícios de que os dados sobre a diminuição de consumo de carne vigentes em muitos países tem relação direta com o veganismo de mercado. As pessoas podem estar comendo menos carne por questões diversas, entre elas o ativismo de mercado, mas pela consciência ambiental que aumentou nos últimos anos, pela militância e ativismo antiespecista, não sabemos o certo. Comer menos carne também não significa menos sofrimento animal, já que ovolactos podem estar aumentando o consumo de laticínios e produtos testados em animais por grandes corporações também. Assim sendo, não temos provas que essa pequena queda apontada por Guilherme Carvalho tenha a ver com uma consciência de libertação animal e humana. Na verdade, sua estratégia, que é findada e aliada ao locupletamento de capital e grandes empresas, é desassociada da luta de classes que, torna-se assim, individualista, vigente de interesses de grandes empresários e a utopia de puro ludíbrio da classe média e seu fetichismo da mercadoria por produtos “menos opressores.”


É ingênuo e ilusório termos a crença de que os capitalistas estão interessados na promoção de bem estar-animal e humano, quando, na verdade, o único interesse que é mantido e estabelecido ali é fixado na expansão do capital. Comprado pelo capitalismo e colocado nas prateleiras de grandes mercados que residem em bairros de classe média e grandes metrópoles, onde a periferia não tem perspectiva e acessos aos produtos feitos. Além de tirar o caráter de movimento social do veganismo, o tornando em mercadoria, o veganismo de mercado, estabelece uma relação direta e uma linha tênue de contradições quando usado para justificar o crescimento de veganos com seus produtos mais caros, inacessíveis e que, apesar de ter o “selo vegano” na embalagem, é proveniente de muito sofrimento animal e humano, desde o seu meio de produção e fabricação, até o momento que chega às prateleiras.


Em parte, essa parcela de população consumidora desses produtos, não são veganos, logo, essas empresas fabricadoras, não estão direcionando suas vendas ao público vegano de fato, e sim a essa parcela de classe média, que vive a partir do fetichismo da mercadoria e status. Sendo assim, o mercado capitalista especista, só está aliado ao veganismo com o intuito de lucratividade e continuará massivamente, dentro dessa ideologia liberal, apropriadora de causas, a realizar testes em animais, vendas, entretenimento e toda derivação de exploração e sofrimento. Essas empresas, como a Hellmann’s, pertencente á Unilever, não vão parar de explorar os animais, subsídios e seus funcionários, muito pelo contrário. Ter um produto com um certificado de “vegano” dado pela SVB (Sociedade Vegetariana Brasileira), não vai fazer com que, milagrosamente, essas empresas milionárias, repensem todo seu modo de produção. Ter um produto com um certificado de “vegano” não vai fazer com que a população tenha uma alimentação de consumo vegetariana e uma filosofia política vegana, visto que, o direcionamento desse produto não é para o público que, de fato, é vegano.

Grande exemplo dessa ilusão é o Estado de Israel, que além de ser opressor, violador dos Direitos Humanos, racista, genocida, está praticando um novo apartheid ao povo Árabe e Palestino, que é ocupada há mais de um século pelos poderes, mãos imperialistas e uma colonização sionista corrente de violência, morte e aprisionamento. O estado antidemocrático de Israel é aclamado por muitos veganos como o melhor país para ser e se manter vegano, já que diversos produtos sem ingredientes de origem animal, graças ao veganismo de mercado, têm sido colocados nas prateleiras; coisa que, de antemão, já se torna contraditória, a partir de toda perspectiva histórica do país, e, muitos veganos israelenses, são ausentes e omissos quando o assunto se trata do Governo, causador de mortes e massacres, assim como os animais que dizem defender e lutar. Os comportamentos de barbárie contra os animais não serão abolidos enquanto houver uma organização governamental sionista com perspectivas fascistas, imorais e cruéis, colidindo-se com valores abolicionistas, que deve ser um dos pilares do veganismo.

A maior evidência de que esse veganismo estratégico é ineficiente pode ser apresentada pelos dados aqui agora apresentados; Israel é o país do Oriente Médio – e um dos maiores no ranking do mundo, per capita, que mais consome e exporta carne. Estima-se uma média de 80,3 kg/ per capita. Os esforços para a redução e abolição do consumo de carne nem são medidos. Todo dispêndio não se limita somente à alimentação, dado que a consumação se estende ao vestuário, lazer e remédios.

Portanto, não temos como “somar”, por exemplo, com “genocidas veganos”, “racistas veganos” ou “misóginos veganos”. De fato, o veganismo é para todos, mas para aqueles que respeitam a todos e querem uma sociedade onde todos querem viver. Ao pregar o veganismo e o antiespecismo, é necessário pregar a democracia em todos os níveis e o fim de todas as explorações, que tem o capitalismo e o neolibealismo, na nossa visão, como um dos pilares estruturantes de maior força gravitacional na era contemporânea. O veganismo, dessa maneira, supera o lucro e o consumo e se transforma em uma ética universal.

A multinacional Unilever é conhecida por ter um departamento próprio de testes em animais e até de especies controladas geneticamente para tal

O veganismo de massas – a verdadeira estratégia

Com o fetichismo da mercadoria e o neoliberalismo em voga que transformou o cidadão em consumidor é evidente que falsas consciências irão surgir que pensam que nossa luta está em comprar e vender, na defesa do consumidor. Mas e para aqueles que não podem consumir, a maioria da população? Estamos pensando aqui em quem tem apenas um salário mínimo para alimentar mais de 4 filhos, quem não tem acesso aos grandes mercados e centros urbanos. Como transformar essa maioria em antiespecistas e veganos?

 Apenas ativismo não programático, conscientização e produtos veganos com selos não irão salvar todos os animais e alimentar pessoas – uma porque uma coisa está relacionada a outra, trabalhadores mais pobres compram mais enlatados e derivados de leite e ovo porque são mais baratos, tem subsídios do Estado, coisa que um Shimeji orgânico não tem, embora a produção seja mais barata. Não ter dinheiro para comer e especismo, portanto, tem intima relação. Assim sendo, comer carne não é necessariamente apenas questão de moralidade.

Dessa maneira, a estratégia que propomos é que o veganismo volte para o lugar de onde nasceu – nos movimentos sociais, entre trabalhadores, no campo e entre os mais explorados. Para isso, devemos:

  • anexar o antiespecismo nas lutas de terra existentes – acabando assim a pecuária e a dominação da classe dominante na terra e nos animais, colocando também a soberania alimentar e o fim da alienação da alimentação para essas pessoas.
  • nas lutas por melhores moradias e salários – para que possam ter condições de comprar e fazer seu próprio alimento, pregando o veganismo popular da cultura de feira brasileira e não dos mercados industrializados do modelo norte-americano do autor.
  • Imbricar o boicote do consumo à carne e derivados ao consumo ético em todos os níveis, boicotando também empresas que realizam ou terceirizam testes em animais e com relação com a escravidão, racismo, machismo e lgbtqfobia.
  • Apoiar ações de intervenção política no Estado, para que leis antiespecistas sejam levadas a cabo, com todo cuidado de não esperar que reformas irão salvar esse sistema
  • Apoiar movimentos que se relacionem com a exploração animal, com a realidade das pessoas e outras explorações como de gênero, raça e principalmente de classe – para que esta, na tomada de seu poder popular, coloque em voga uma sociedade antiespecista em todos os níveis.

O fim do especismo é uma trajetória grande, mas muito avançamos nesse debate graças a radicais que pensaram que debater o impossível era tornar coisas possíveis.

Membros do Animal Liberation Front considerados radicais por libertarem animais de gaiolas na Inglaterra

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Written by Kauan Willian

Doutorando em História Social (USP). Historiador da classe trabalhadora e professor da rede municipal de São Paulo, militante sindicalista e ativista antiespecista.